De que forma estamos olhando para nossas cidades? Como vislumbramos o amanhã?
Nas últimas semanas, venho acompanhando pelas mídias sociais a movimentação em torno da preparação das diretrizes setoriais para o Ministério da Cultura, com intensa participação da sociedade civil. É louvável que o ministério esteja conduzindo de forma democrática o processo e também que tenham sido convidados para participar da gestão pública pessoas atuantes e ativas na articulação desses setores, com ideias novas e vontade de pensar adiante.
Mas um fato continua a produzir um profundo incômodo: onde fica a arquitetura — e o urbanismo e o design — nesta história?
A arquitetura não faz parte das políticas públicas e não tem reconhecida oficialmente a sua dimensão cultural. Isso ocorre não apenas no nível federal, mas se replica em todas as outras esferas e em outros campos da sociedade. Nos cadernos culturais dos jornais, há seções para artes visuais, teatro, cinema, literatura… mas onde está a arquitetura?
Poderíamos especular diversas razões para isso, desde uma ressaca do movimento Moderno à influência de empreiteiras e incorporadoras junto à gestão pública, ou mesmo um corporativismo conservador da classe. Mas talvez não sejam quaisquer desses motivos. O fato é que hoje a arquitetura não faz parte das políticas culturais, exceto quando se trata de patrimônio histórico.
Onde é que fica a arquitetura produzida hoje? De que forma estamos olhando para nossas cidades? Como vislumbramos o amanhã?
O resultado dessa pouca atenção está materializado na pobreza e no descuido na construção de nossas cidades e na deterioração da qualidade da vida e da paisagem urbana. Isto não significa que o Ministério da Cultura deveria ser responsável por planejar nosso desenvolvimento urbano, mas ele tem o dever — e a oportunidade — de fomentar o debate sobre as cidades e, principalmente, sobre como queremos viver nelas. Os espaços que habitamos são o campo da nossa experiência cotidiana. Qualificar esse campo não é só uma questão de infraestrutura ou funcionalidade, mas uma questão cultural urgente.
A arquitetura possui uma dimensão objetiva e técnica que a diferencia das demais artes. Não é à toa que uma parte das faculdades de arquitetura do país está alocada nos departamentos de artes, e a outra nos politécnicos. O arquiteto e urbanista Lúcio Costa reclamou que havia muita construção e pouca arquitetura. Como definir o que é arquitetura? Arquitetura é arte? Esse é um debate sem fim que, sinceramente, não considero relevante. Contudo, o que não podemos deixar escapar é a percepção de sua dimensão cultural. As cidades são a maior invenção do homem. Fazer e habitar a cidade são os nossos maiores fatos culturais.
Como fomentar inovação e experimentação, tanto em desenho como em processos? Como abrir oportunidades para os jovens? Como pensar a arquitetura e a cidade como campos de experiência? O que significa imaginar o futuro da vida urbana? O nosso futuro nas cidades passa pela arquitetura. Para que possamos um dia ambicionar novas perspectivas de cidade, um passo importante seria o Ministério da Cultura incorporar a arquitetura no seu planejamento.